18 de dezembro de 2014

Pedro Russo recebe novo prémio europeu

 

     O cientista Pedro Russo, natural de Figueira de Castelo Rodrigo, foi distinguido a nível europeu pelo trabalho que tem desenvolvido através com o projecto internacional que coordena, considerado o melhor programa educativo europeu em ciência.

    A este projecto internacional, que coordena na Universidade de Leiden (Holanda), centrado na divulgação e educação em astronomia e ciências do espaço, foram atribuídos dois milhões de euros de financiamento do programa europeu Horizonte 2020, para os próximos três anos.

    Pedro Russo foi o Coordenador Global do Ano Internacional da Astronomia, cujo programa decorre até finais de 2009.

    Recordamos, a propósito, a entrevista que nos concedeu em Novembro desse ano, a qual foi publicada na Revista “Praça Velha”, editada pela CMG.

Pedro Russo - foto Helder Sequeira.jpg

 

ASTRONOMIA PORTUGUESA

(RE)AFIRMADA A NÍVEL MUNDIAL

 

Helder Sequeira

 

     Coordenador Global do Ano Internacional da Astronomia, cujo programa decorre até finais de 2009, Pedro Russo é um dos expoentes da nova geração de cientistas portugueses.

     Natural de Figueira de Castelo Rodrigo, e residente em Munique (Alemanha), Pedro Russo é licenciado em Física/Matemática Aplicada (ramo Astronomia) e Mestre em Geofísica pela Universidade do Porto. O seu trabalho no Instituto Max Planck está relacionado com o estudo da atmosfera do planeta Vénus. Integra a equipa de trabalho da Agência Espacial Europeia, é editor da revista científica Communicating Astronomy with the Public e colabora, activamente, com organizações como a União Astronómica Internacional, Rede Europeia de Ciências Planetárias, Federação Astronáutica Internacional e União Geofísica Internacional, entre outras.

    Actualmente o seu trabalho principal cruza-se com uma multiplicidade de tarefas e acções inscritas no programa do Ano Internacional da Astronomia (AIA) que coordena à escala global. Promovido pela União Astronómica Internacional, o AIA pretende ser o contributo desta ciência para a sociedade e cultura e estímulo para o interesse científico.

    Nesta entrevista que concedeu à Revista PRAÇA VELHA, facilitada pelas novas tecnologias da informação, Pedro Russo defendeu o investimento em centros científicos a localizar nas zonas mais desfavorecidas do interior de Portugal. “Um Centro de Investigação Astronómica na Guarda faria todo o sentido”.

 

    Quais os principais objectivos do Ano Internacional da Astronomia ?

   Quando o Ano Internacional da Astronomia começou, já em 2003, tivemos que estabelecer os objectivos gerais, que são vários; delineámos oito objectivos essenciais para o programa. Gostaria de destacar dois ou três.

    Um deles, claro, é o apoio à educação das ciências e à própria divulgação, usando a astronomia como ferramenta para chegar ao público, mostrando a importância que a ciência e tecnologia têm na sociedade de hoje. É o objectivo número um, é o objectivo genérico do Ano Internacional da Astronomia.

    Depois temos outros projectos: apoiar a educação formal e não formal das ciências; nos programas escolares, nos programas de Centros de Ciência, nos Planetários, etc. Antigamente tínhamos a ideia que o Ano Internacional deveria ser global, internacional e, aparentemente, tínhamos que apoiar os países em vias de desenvolvimento; o apoio foi de certa forma dimensionado definidos que foram os objectivos do AIA

    Que balanço faz, até ao presente mês de Outubro, das actividades e resultados do programa elaborado para se assinalar o AIA?

    Não temos ainda uma ideia concreta de qual é o alcance e o impacto assumido a nível global; ainda é muito cedo para tirarmos conclusões. É claro que temos recebido alguns relatórios preliminares dos diferentes países.

    E são positivos?

    São muito positivos. Chegámos a quase 3 milhões de pessoas, confirmadas, que participaram em actividades relacionadas com AIA. Este número, que tem vindo a crescer, é o que temos, em relatórios, com informação credível. Tenho a convicção que este número pode ser multiplicado por dois ou por muitos mais.

    Existem áreas privilegiadas no programa das comemorações?

    Há a área da educação que é muito importante e tem chegado a muita gente, sobretudo a muitos professores; tem havido muitas acções de formação realizadas um pouco por todo o lado.

    As palestras públicas são das iniciativas onde mais gente tem participado. Tem havido exposições por todo o lado e muitas vezes em locais não muito convencionais, como sejam estações de comboio, aeroportos, jardins públicos, etc.  Chegarmos a um público que não está habituado a ver ciência, a ver astronomia é, também, um dos objectivos do AIA

    Quais as zonas geográficas que têm evidenciado mais adesão por parte das pessoas?

    Na Europa temos tido uma adesão muito grande. Portugal, Espanha, França, Inglaterra, Alemanha têm tido imensas actividades.

    Tenho a sensação que as próprias pessoas, responsáveis pelos AIA dos vários países, não têm conseguido acompanhar as actividades que acontecem diariamente; por vezes as pessoas são surpreendidas com actividades muito grandes que se realizam e de que elas não tinham conhecimento. Ora isto também se enquadra nas finalidades do AIA.

    É importante que qualquer pessoa, do mero astrónomo amador ao astrónomo profissional, ou apenas um entusiasta, faça algo para o AIA, e, felizmente, isto acontece.

    Destacaria a Europa, também a América Latina e a América do Norte que têm a desenvolvido muitas actividades; posso dar-lhe alguns exemplos: as actividades no Brasil são imensas e também na Ásia, China, Japão, Tailândia, Indonésia. São inúmeros os países onde tem havido imensas actividades.

    Até agora, na sua opinião, qual foi o momento mais marcante em todas essas actividades?

    O projecto global passava pelo desenvolvimento do projecto “100 Horas de Astronomia” que aconteceu no passado mês de Abril. Era um projecto que pretendíamos fosse realizado durante 100 horas, no decorrer do qual pelo menos uma parte do evento fosse relacionado com a astronomia.

    Efectivamente, foi o maior evento de sempre, de divulgação de ciência, que aconteceu no nosso planeta. Foi um evento único e como deduzi pelos relatórios e pelas imagens de todo o mundo constituiu um momento marcante do Ano Internacional da Astronomia.

   A função de Coordenador global para o AIA abriu-lhe novas portas em termos de investigação que desenvolve?

   Posso dizer-lhe que se calhar abriu-me muitas portas mas também me fechou. Face às funções de coordenador global, a minha carreira como investigador e a actividade como cientista têm estado um pouco paradas. Tenho-me dedicado a tempo inteiro à coordenação global, que é realmente um trabalho que ocupa grande parte do dia e não deixa espaço para me dedicar à investigação.

   Surgem, contudo, novas oportunidades, novas áreas de astronomia que são um bocadinho distantes; conheci novas pessoas que fazem trabalhos fantásticos e agora tenho uma perspectiva diferente de como é a astronomia no mundo, não só na Europa, não só nos países ricos, desenvolvidos, mas também o que é a astronomia nos países em vias de desenvolvimento.

   A função de coordenador global abriu-me uma nova perspectiva da astronomia e novos horizontes para a investigação.

   Considera que a sua escolha para Coordenador contribuiu para a afirmação da astronomia portuguesa no contexto internacional?

   A astronomia portuguesa já se tinha afirmado no contexto internacional e a nível europeu.

   O contrato de Portugal para a Agência Espacial Europeia e mais tarde para o ESO foi o passo que marcou a internacionalização da astronomia portuguesa.

   A minha escolha foi apenas algo mais que aconteceu no panorama da astronomia nacional, onde há pessoas como a Doutora Teresa Lago; quando foi nomeada para o Conselho Europeu de Investigação (European Research Council) esse foi um passo ainda maior na afirmação da astronomia portuguesa.

   Tem sido dada a devida atenção à influência do estudo da astronomia nas restantes ciências?

    Uma das áreas que se tem vindo a desenvolver nas últimas décadas é muito próxima de outras ciências; refiro-me à astrobiologia que é um bocadinho a junção da biologia e da astronomia, um bocadinho o estudo da origem da vida, da evolução da vida, não só no nosso planeta mas também no universo. Essa, se calhar, é uma das áreas mais desenvolvidas e onde tem havido mais ligações entre a astronomia e as outras ciências.

   Daí que a astronomia, como ciência, não viva sozinha, vive muito de ciências afins como é o caso da física, da matemática, da ciência das partículas e muitas outras áreas, nomeadamente do próprio desenvolvimento tecnológico, etc.

     Colocando agora de lado a actividade que desenvolve em termos do AIA, como caracteriza o seu trabalho no seio da Agência Espacial Europeia?

    Trabalhava na Vénus Express e fazia parte das equipas científicas responsáveis pelas câmaras fotográficas a bordo dessa missão; tinha como trabalho apoiar toda a parte de planeamento.

    Estava sobretudo ligado à parte científica da missão Vénus Express e também à área do planeamento, do tipo de imagens que tínhamos que obter, dos objectivos científicos a alcançar, etc. Era este o meu trabalho dentro do âmbito da Agência Espacial.

    A investigação em Portugal é relevante? Acha que a classe política é sensível ao alcance dos projectos de investigação e faz uma avaliação justa dos apoios financeiros necessários?

    A investigação em Portugal em termos de astronomia, que é a área que eu conheço melhor, é, sem dúvida, relevante. A comunidade da astronomia portuguesa é bastante activa, tem imensas publicações em revistas conceituadas a nível internacional. Tem feito um trabalho sem dúvida exemplar e daí colheu os seus frutos.

    Muitos astrónomos portugueses participam em projectos internacionais; são, aliás, muitas vezes os investigadores principais de alguns desses projectos e têm vindo a demonstrar que têm capacidade de competir com outras equipas na Europa e no resto do mundo.

    A classe política tem prestado alguma atenção, tem sido sensível aos alcances de alguns projectos e apoiou, por exemplo a adesão de Portugal à Agência Espacial Europeia, e mais tarde à Organização Europeia para a Investigação em Astronomia, tem viabilizado também algum apoio financeiro. Ao nível da avaliação eu, realmente, não tenho dados precisos, não sei como funciona a avaliação dentro do seio da Fundação da Ciência e Tecnologia e como podia apoiar mais, ou ajudar mais, a comunidade portuguesa a ser ainda mais competitiva no panorama europeu.

    Neste contexto, acha que é fácil o acesso dos jovens europeus, a projectos de investigação científica na área da astronomia?

    Sim, sem dúvida. Qualquer jovem português ou europeu que queira estudar astronomia tem a vida facilitada.

    Na Europa, e em Portugal, já existem bastantes programas que permitem aos jovens de diferentes áreas científicas terem uma carreira ligada à astronomia. As próprias Agências europeias abrem também as portas a jovens europeus de forma a poderem participar em projectos de âmbito europeu ou internacional.

    Esses projectos estão suficientemente divulgados, sobretudo em Portugal?

    Talvez seja uma área em que podíamos trabalhar mais. Há sem dúvida uma ideia errada que as áreas de ciências e tecnologia são áreas com pouco saídas profissionais; acho que os últimos indicadores apontam realmente o contrário.

    As pessoas que gostam, que têm investido em carreiras de ciências e tecnologia têm encontrado mais facilidade nos empregos que as pessoas oriundas de outras áreas.

    Existem muitas oportunidades, não só em Portugal mas principalmente na Europa. Há muitas oportunidades para esses jovens e às vezes é preciso saber onde estão essas oportunidades.

    É fundamental fazer alguma pesquisa para encontrar as oportunidades certas; provavelmente esse será um trabalho das agências nacionais, ou seja mostrar aos jovens portugueses onde estão essas oportunidades e como é que as podem agarrar; importa também ajudá-los a vencer os obstáculos específicos de algumas dessas candidaturas.

    Assinalam-se, em 2009, os 400 anos após a primeira utilização do telescópio por parte de Galileu. A História da Astronomia tem tido o relevo adequado nos programas de ensino, quer a nível de Portugal quer a nível Europeu?

    Não conheço com rigor os programas de ensino da ciência ou os programas de ensino de história em Portugal.

    Lembro-me que quando eu estudava, uma das disciplinas onde descobri a história da astronomia – um bocadinho com a mudança de atitude e a mudança de pensamento, com Galileu Galilei, em 1609 /1610 – foi na área da filosofia.

    Recordo que fizemos trabalhos, com alguma profundidade sobre a importância que Galileu teve como o pai da ciência moderna e da astronomia moderna; um pouco como o cientista que revolucionou a nossa forma pensar teve em diferentes áreas, não só na ciência, na tecnologia, mas também na filosofia.

     Eu penso que há algumas referências da história da ciência, da história da astronomia nos programas de ensino. Também acredito que no ensino da história, em especial no ensino da história de Portugal relativa ao período dos descobrimentos, é evidenciada a importância que o nosso país teve no desenvolvimento da astronomia de navegação com sextante (muitas vezes referido como o astrolábio) e todos os outros instrumentos de navegação que estavam de certa forma ligados à astronomia.

    Que importância atribui a um maior desenvolvimento deste estudo da História das Ciências, quer a nível dos ciclos de ensino anteriores ou superior?

    A história do pensamento científico, a história das ciências como um todo, é importante para as diferentes áreas. As próprias revoluções que a humanidade foi sofrendo, um pouco devido à astronomia, são importantes para o seu desenvolvimento como um todo.

    Considero que devia estar mais presente em muitas outras áreas; podia falar por exemplo das descobertas de Einstein, da Teoria da Relatividade, etc.

   São muitas as revoluções que nós temos vindo a sentir ao longo do tempo; esta pode ser uma forma de reflectir sobre o pensamento científico e que poderia ajudar as outras áreas do saber. É muito importante que os jovens universitários tenham essa consciência da importância que a ciência tem nas diferentes áreas.

    Na sua perspectiva, quais os locais mais emblemáticos no mundo ao nível da História da Astronomia?

    É uma pergunta bastante difícil; se olharmos para o período temporal das descobertas da astronomia são vários os locais, são várias as civilizações que tiveram uma importância acrescida na astronomia.

    Começamos ainda antes da Grécia antiga. Os filósofos e a forma como eles colocaram as questões ainda são muitas vezes as interrogações que nós colocamos em astronomia – são sem dúvida quase o motor para a astronomia moderna.

    Mas existem outras civilizações, como na China antiga, na América Latina, onde houve um desenvolvimento inegável no conhecimento de astronomia, que não se resumia ao conhecimento de astronomia que tínhamos na Europa; não esqueçamos o Renascimento, no século XVII, na Europa que foi sem dúvida um certo centro de todo o desenvolvimento para a astronomia.

    Vários locais como a Itália, a Alemanha, a República Checa, a Dinamarca, foram muito importantes para a História da Astronomia. Hoje em dia, se calhar, a História da Astronomia vai ser marcada por outros sítios onde estão localizados os grandes telescópios, como no Chile, no Hawai, os ensaios do Rádio telescópio, o próprio lançamento dos Space Shuttle, o vaivém espacial dos Estados Unidos.

    Todos esses locais vão de certeza ficar marcados na história da astronomia daqui a uns anos.

    Que análise faz do ensino experimental nas Escolas portuguesas? Há uma grande diferença com a realidade dos restantes países europeus?

    Portugal tem feito um investimento muito grande a equipar as escolas, não só as secundárias mas também as escolas do ensino básico, com material de apoio ao ensino experimental das ciências. Muitas escolas têm o equipamento correcto para ensinar astronomia do ponto de vista mais experimental.

    Até que ponto os professores, ou quem poderia usar esse material tem informação adequada ou tem tempo para usar em proveito desse ensino experimental é algo que não sei. Desconheço qual tem sido o alcance desse material.

    Vejo e sinto que posso fazer uma comparação com aquilo que eu tive na minha escola secundária e no ensino básico; verifico que os meus colegas europeus tiveram um uso mais recorrente dos laboratórios e destaco a forma como eles usavam o ensino experimental para desenvolver os seus conceitos. Noto que muitos dos jovens que estudaram comigo têm mais habilidade em trabalho laboratorial do que eu tenho, provavelmente devido à minha falha de ensino experimental das ciências, nesse período escolar.

    Mas tem havido alterações positivas nesse campo e tudo leva a crer que, hoje em dia, os jovens que saem do ensino secundário têm uma maior afinidade para trabalhar num laboratório e para saberem, realmente, que a ciência é experimental.

     Como encara, hoje, o trabalho que desenvolveu na Fundação Navegar em termos da produção de material educativo orientado para o estudo da astronomia?

     Posso dizer que a Fundação Navegar foi uma escola para mim. Foi aí que eu descobri o meu gosto pela divulgação da astronomia e pela educação da ciência em geral; um local de muitas possibilidades para desenvolver diferentes projectos, a diferentes níveis, e foi um laboratório para mim em termos da divulgação da astronomia.

     Qual o papel que tem a Internet na difusão destas questões relativas ao estudo e também ao interesse pela astronomia por parte dos jovens?

     A Internet, hoje em dia, desempenha um papel muito importante na disseminação de informação, não só nas áreas das ciências como em todas as áreas. Cada vez há mais o uso da Internet por qualquer tipo de pessoa, com vista a procurar de informação e de conhecimento. É algo que já existe um pouco por todos os países desenvolvidos, e é claro que a Internet desempenha um papel essencial.

     Posso dizer-lhe que no AIA, a internet é a ferramenta principal para toda a coordenação; sem Internet o Ano Internacional da Astronomia seria de certeza outro e se calhar com menos impacto do que está a ter. A Internet tem um papel essencial em qualquer área de estudo, em qualquer área das ciências, em qualquer área de conhecimento.

     Este ano, esteve já na sua terra natal, a falar com jovens do ensino secundário. Como vê o contacto de um investigador ou dos investigadores com a escola. Acha que pode incrementar o interesse dos jovens com a ciência?

     Se os jovens tiverem oportunidade de falar com um astrónomo, de falar com um cientista ou falar com os investigadores também têm uma ideia diferente do que é realmente o seu trabalho.

     Há uma ideia, muitas vezes romântica, muitas vezes errada sobre qual é o trabalho diário do investigador, o que ele faz, quais são os objectivos, qual é seu o dia-a-dia. Ora se os jovens tiverem uma ideia mais concreta, mais realista sobre o trabalho do investigador tenho a certeza que também poderão considerar a carreira de investigação como opção para o seu futuro. O contacto entre investigadores e os alunos é bastante importante.

     Actualmente há jovens investigadores, é o seu caso, que se têm vindo a distinguir em termos internacionais. Como vê esta nova realidade?

     Eu vejo isto com bastante agrado. Tenho acompanhado o percurso de alguns colegas meus, jovens investigadores, que estão a trabalhar quer no estrangeiro, quer em Portugal. Tenho acompanhado alguns percursos e verifico que muitos deles têm feito carreiras brilhantes em termos de investigação, têm alcançado objectivos que se calhar há uns anos atrás não estavam ao alcance de muitos investigadores que hoje temos nas universidades.

     Digo isto, porque a entrada de Portugal para a União Europeia também abriu muitas portas para se desenvolverem novas carreiras no exterior, na Europa e noutros continentes.

      Hoje vemos que os jovens portugueses estão tão bem preparados como quaisquer outros jovens, a nível mundial, para alcançarem posições de destaque em ciência, tecnologia e outras áreas.

      Ainda assim, na sua opinião, o que é necessário ou indispensável para fixar, progressivamente, mais jovens cientistas em Portugal?

     O que falta em Portugal é algo que já tem sido muito falado e assim não vou dizer nada de novo: é criar as condições de trabalho que sejam parecidas com as condições de trabalho que os jovens têm lá fora.

     Quando falamos de condições de trabalho, falamos em condições laboratoriais, condições de equipamento dos próprios centros de investigação, porque muitos deles já estão bastante bem equipados e com o material correcto para a sua investigação.

      Ao nível da carreira cientifica o que é que um jovem com trinta e poucos anos poderá querer em Portugal? Qual é realmente o interesse que ele tem de voltar para Portugal, senão tiver uma carreira idêntica à que pode encontrar lá fora? Ou seja, se conseguirmos equiparar-nos às carreiras que existem no resto da Europa e em países que têm um grande ímpeto de produtividade científica (como é o caso da Alemanha, da França, da Inglaterra) poderemos atrair e fixar muitos destes jovens investigadores; mas não só os portugueses, também de outras nacionalidades que poderão ser uma mais-valia para a própria ciência em Portugal.

     Referiu que o seu envolvimento na coordenação global do AIA o afastou investigação que estava a desenvolver. Em que área tem incidido essa investigação?

     Na minha investigação, trabalho principalmente com planetas terrestres.

     Chamamos planetas terrestres aos planetas que são próximos da nossa estrela, o Sol, como é o caso do planeta Vénus e do planeta Terra. Efectuei algum trabalho com o planeta Marte, depois dediquei-me um bocadinho mais ao estudo da atmosfera do planeta Vénus.

    É realmente o meu objectivo principal de investigação, em termos gerais, compreender qual foi a evolução destes três planetas: Vénus, Terra e Marte; quais foram as diferenças na evolução e porque é que se tornaram planetas tão distintos.

     O planeta Marte é quase um planeta completamente deserto, quase sem atmosfera, sem vida; o planeta Terra é sem dúvida um dos planetas mais interessantes que temos em todo o Universo, que brota vida um pouco por todo o lado, com uma atmosfera bastante estável, com os oceanos, com uma biodiversidade única; e o planeta Vénus é um planeta completamente coberto com densas nuvens.

     São planetas de certa forma muito parecidos do ponto de vista geológico, do ponto de vista geofísico mas que tiveram percursos diferentes na sua evolução. Compreender esses percursos diferentes é que norteia a minha investigação.

      Um Centro de Investigação Astronómica no distrito da Guarda: pura utopia ou um projecto com alguma viabilidade?

      Qualquer projecto de Centro de Investigação tem a sua viabilidade; se calhar existem projectos que não têm uma viabilidade pelo elevado investimento a nível de infraestruturas; a astronomia não depende muito de infraestruturas locais, isto é, a maior parte dos Centros de Investigação de Astronomia que hoje existem por todo o mundo não estão próximos dos grandes observatórios, como os telescópios no Chile, como os telescópios no Havai, como os telescópios nas Ilhas Canárias.

       Estão em locais em que os astrónomos apenas precisam de gabinetes, de computadores, de acesso à Internet, onde possam usar os dados recolhidos pelas missões espaciais – pelos telescópios que estão espalhados em locais remotos, por todo o mundo – onde possam trabalhar esses dados.

      Por isso, um Centro de Investigação de Astronomia na Guarda faria todo o sentido, não vejo porque não; desde que haja um interesse por parte da comunidade académica da Guarda ou da comunidade académica portuguesa.

      Se lhe dessem essa oportunidade, ou se estivesse nas suas mãos uma decisão a esse nível, apostava na Guarda?

      Eu apostava na Guarda e apostava no interior português. Acho que temos de descentralizar as estruturas, não só as estruturas a nível científico mas as estruturas culturais que temos em Portugal.

      Não há necessidade de continuarmos a investir, continuamente, nos grandes centros urbanos portugueses; a investir aí em equipamentos culturais, equipamentos científicos, porque hoje temos fácil acesso a todas as infraestruturas como são aeroportos, como são estações de comboio um pouco por todo o território português.

     Assim, já não faz sentido fazer-se apenas investimentos elevados nas tradicionais zonas urbanas mas importa descentralizar as estruturas e descentralizar também muitos Centros de Investigação localizando-os em áreas do interior, como é o caso da Guarda, como é o caso da Covilhã, como é o caso de Vila Real e Bragança, etc.

     As várias cidades do interior poderiam receber Centros de Investigação de qualidade europeia e qualidade internacional.

 

     in Revista Praça Velha, Novembro 2009

 

 




Artigo Completo: Pedro Russo recebe novo prémio europeu
Fonte: correiodaguarda
5 O CHIBITO: Pedro Russo recebe novo prémio europeu        O cientista Pedro Russo, natural de Figueira de Castelo Rodrigo, foi distinguido a nível europeu pelo trabalho que tem desenvolvido...

02:59 | 18 de dezembro de 2014


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